Pagamos um alto preço por termos adotado uma postura bípede, onde temos de nos sustentar sobre uma base de equilíbrio relativamente estreita (os pés), e ainda à mercê das tentações de conforto da modernidade que tanto conspiram contra nossa boa postura. Mas o que é equilíbrio muscular afinal de contas? E o que isto tem com a estabilidade e o desempenho tanto físico-esportivo quanto nas atividades de vida diária (AVD’s)? Dentro de diversas definições de postura ereta, a que mais se enquadra nesse cenário nos diz que:
“O equilíbrio postural é constituído de uma sucessão ascendente de desequilíbrios controlados pela musculatura tônica. Cada segmento de nosso corpo deve equilibrar-se, e esse equilíbrio será também condicionado pelos segmentos corporais adjacentes.” (Carneiro, 2003)
Dessa maneira, o nosso corpo está constantemente sujeito a alterações do padrão de normalidade de equilíbrio dentre os mais diversos segmentos corporais. Devemos entender que todas as articulações do corpo precisam estar alinhadas para que sejam capazes de absorver choques, permitindo a dissipação de forças no solo. A musculatura ao redor das articulações precisa manter um nível ótimo de tensão em todas as direções a fim de sustentar cada articulação na posição ideal. Caso as forças que atuam sobre nosso corpo estejam desequilibradas, as ações musculares, articulares e seus respectivos movimentos apresentarão alterações em seus padrões. Em caso de dor, involuntariamente limita-se a amplitude de movimento e altera-se ainda mais o padrão de movimento como forma de acomodar a articulação ou tecido em sofrimento durante as AVD’s, bem como nos exercícios da musculação ou outra atividade física qualquer. Isto pode se tornar uma bola de neve levando a problemas em outras articulações devido à redução do controle neuromuscular por padrões precários de movimento.
Assim sendo, os desequilíbrios musculoarticulares se dão em função de alterações dos padrões de:
-Flexibilidade;
-Força;
-Estabilidade (sinergismos musculares incompetentes);
-Movimentos repetitivos;
-Posturas errôneas sustentadas.
Tais padrões alterados induzem a movimentos imprecisos, gerando ações musculares compensatórias. Consequentemente, isto aumenta a suscetibilidade direcional do movimento, que por sua vez, expõe as estruturas envolvidas a microtraumas e por superposição destes, a macrotraumas.
O aparecimento de um macrotrauma por superposição de microtraumas leva tempo; semanas, meses às vezes anos. Quando este dá sinal, onde a dor é o primeiro e maior indicativo de que alguma coisa não vai bem, o processo já está instalado e sua recuperação, da mesma forma, demandará tempo, limitando não só a prática física bem como a movimentação normal do indivíduo. Portanto, caímos na velha máxima que diz que “é muito melhor prevenir do que remediar”.
A segurança do indivíduo na musculação passa por um processo de avaliação funcional minucioso à busca de padrões alterados. De posse desses dados, o profissional de Educação Física passará pelo momento mais crítico, elaborar a rotina ideal de exercícios para aquele momento.
Chamaremos isto de primeira INTERVENÇÃO GLOBAL, onde o professor armado de conhecimento técnico-científico suficiente para compor espacialmente o padrão postural do indivíduo, ou seja, como se relacionam os padrões de encurtamento e/ou alongamento excessivos, bem como os padrões de força ou fraqueza muscular entre os diversos grupos musculares que possam estar gerando o padrão postural observado para aquele momento, como se fechando os olhos este pudesse “enxergar” o padrão postural geral e reorganizá-lo dentro de um ideal possível.
Após isto, partimos para a INTERVENÇÃO LOCAL, selecionando os exercícios e posturas adequadas ao momento e sem perder de vista o dia a dia do cliente durante sua rotina diária de vida, bem como dentro da sala de musculação e como este está “reagindo” e evoluindo como um todo ao treinamento, novamente aqui observando a INTERVENÇÃO GLOBAL. Portanto, temos que ter em mente a sequência GLOBAL-LOCAL-GLOBAL.
Infelizmente, o que temos observado dentro da musculação é um excesso de segmentação do indivíduo! Tal segmentação, entre outros tantos fatores, passa muitas vezes pelo uso excessivo de máquinas que isolam este ou aquele grupo muscular, sem a menor preocupação de seus reflexos dentro do contexto global-local-global, afinal de contas, ninguém é apenas um braço forte, ou um grande peitoral, um belo par de coxas ou um bumbum bonito!
Acima de tudo, não devemos esquecer que, musculação é aplicação de sobrecarga em padrão repetitivo de movimento, desta forma, esta tem o potencial de gerar padrões alterados e desencadear quadros de dor e lesão caso não seja executada dentro de posturas e sequências de ativações musculares absolutamente corretas. Mais uma vez, caso o profissional não tenha a “visão do todo”, ou seja, a noção da interação entre as diversas cadeias musculares e entre os sistemas orgânicos de suporte (fáscias musculares e sistema osteoarticular) na composição do padrão postural global, este poderá estar contribuindo ainda mais para futuros problemas de ordem musculoesquelética do indivíduo. Portanto, é imperativo que o quadro esteja sendo reavaliado periodicamente (num tempo nunca superior a três meses) à busca de novos padrões alterados, uma vez que grupos musculares diferentes apresentam padrões diferentes de ganhos de força e/ou flexibilidade.
Independentemente da qualidade da avaliação prévia do cliente, o reconhecimento de padrões alterados de movimento pelo professor somente será possível caso este conheça os padrões corretos! E isso passa invariavelmente pela aplicação de todo seu conhecimento técnico-científico em sua experiência prática própria na musculação. O professor de musculação precisa “sentir na pele” as dificuldades de sustentar determinadas posturas durante a execução dos mais variados exercícios e assim ao longo da prática “criar” sequências de progressões pedagógicas (do mais simples para o mais complexo) em função do grau de dificuldade de execução destes.
Para testar o equilíbrio muscular, não é necessário nenhum tipo de equipamento sofisticado ou aparelho de medição. Observe a postura do indivíduo, tanto estática quanto dinâmica durante a realização de qualquer gesto. Isto lhe dará praticamente tudo que precisa para determinar quais músculos estão fracos e quais estão constritos. Mas infelizmente, um conceito teoricamente simples é absurdamente menosprezado durante a montagem de programas de treinamento em musculação.
PRECISAMOS MANTER EM MENTE QUE O CORPO INTEIRO FUNCIONA COMO UMA UNIDADE ÚNICA!
Prof. Eder Lima
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